

O magistrado ressaltou que, reconhecida a abusividade dos reajustes, os índices da ANS podem ser aplicados mesmo a planos coletivos.
Juiz anula reajustes abusivos de plano de saúde coletivo e determina aplicação de índices da ANS. Foto/PMETRP
O juiz de Direito Carlos Guilherme Roma Feliciano, da 1ª vara Cível de Ribeirão Pires/SP, anulou os reajustes anuais aplicados desde 2019 em plano de saúde coletivo por adesão, determinando que sejam substituídos pelos índices autorizados pela ANS para contratos individuais. A operadora também foi condenada a restituir ao consumidor os valores pagos a maior nos últimos três anos.
O magistrado destacou que, embora os percentuais da ANS se destinem a planos individuais, nada impede sua aplicação aos planos coletivos quando os índices aplicados pela operadora forem abusivos.
“Assim, considerando que os requeridos não lograram em demonstrar, de maneira concreta, a regularidade dos índices aplicados, de rigor o reconhecimento da abusividade dos reajustes impostos ao consumidor desde 2019. Ante o afastamento dos reajustes impugnados, devem ser aplicados às mensalidades os índices autorizados pela ANS para os planos de natureza individual e familiar.”
O caso
Segundo os autos, o consumidor, beneficiário de plano coletivo por adesão desde 2018, relatou que sua mensalidade saltou de R$ 354 para R$ 1,6 mil, aumento superior a 360%. Ele alegou que os reajustes foram justificados de forma genérica, com base na suposta sinistralidade do grupo, sem comprovação concreta e em percentuais muito superiores aos autorizados pela ANS.
Diante disso, pleiteou a anulação dos reajustes desde 2019, a aplicação dos índices da ANS e a devolução das quantias pagas indevidamente, com correção e juros.
A operadora e a administradora do plano contestaram os pedidos, alegando que os reajustes foram amparados contratualmente e visaram manter o equilíbrio econômico-atuarial diante do aumento dos custos da saúde suplementar. Segundo elas, os índices da ANS não se aplicariam aos planos coletivos.
Afirmaram, ainda, que cumpriram com o dever de informação por meio de extratos detalhados, e que não seria possível limitar reajustes futuros aos parâmetros da ANS, por se tratar de eventos incertos.
Reajuste injustificável
Ao analisar as provas, o juiz concluiu que a operadora não comprovou aumento real de sinistralidade ou de custos médicos que justificasse os reajustes. Os extratos e planilhas eram genéricos e não faziam referência ao contrato do autor, e os avisos de reajuste ao consumidor tampouco apresentavam justificativas técnicas.
Para o magistrado, a ausência de justificativa técnica para os reajustes torna a conduta da operadora abusiva. Ele destacou que, mesmo em contratos coletivos, os aumentos precisam ser fundamentados em dados objetivos.
“Assim, em que pese os reajustes por sinistralidade ou variação de custos médicos não sejam, por si sós, abusivos e ilegais, faz-se necessário que os aumentos sejam devidamente justificados pelas operadoras, por meio de documentos que comprovem a necessidade da majoração em razão de um efetivo aumento de sinistralidade ou da variação dos custos médicos hospitalares. Não foi o que ocorreu.”
Aplicação dos índices da ANS
O juiz destacou que, embora os contratos coletivos por adesão não estejam sujeitos aos percentuais fixados pela ANS, as operadoras estão obrigadas a justificar de maneira idônea qualquer reajuste. Essa exigência decorre do dever de informação e da transparência contratual previstos no CDC, aplicável à relação entre as partes, conforme pacificado pela jurisprudência.
“No caso sob análise, o plano contratado pela parte autora é o coletivo por adesão, (…) importante destacar que apesar de tal modalidade não se submeter aos índices fixados pela ANS, atrelados exclusivamente aos planos de natureza individual, as operadoras não estão autorizadas a procederem reajustes desarrazoados nas mensalidades sem a devida justificação e transparência aos beneficiários.”
Baseado em precedentes do TJ/SP e do STJ, o magistrado entendeu que, na ausência de justificativa válida, é legítima a aplicação por analogia dos índices da ANS, como parâmetro de razoabilidade.
“Apesar de alegar que os aumentos estão pautados em critérios devidamente previstos no contrato firmado pelas partes (…), as requeridas não apresentaram nenhum documento apto a demonstrar um efetivo incremento em suas despesas a fim de justificar os reajustes aplicados.”
Assim, o juiz declarou nulos todos os reajustes praticados desde 2019 e determinou sua substituição pelos índices da ANS. As operadoras deverão restituir os valores pagos a maior nos últimos três anos. Além disso, a sentença determinou que reajustes futuros somente serão válidos mediante fundamentação atuarial expressa, sob pena de substituição automática pelos índices da ANS.
