Fernanda Henrique: a força feminina na política de Ribeirão Pires

Vereadora e atriz, Fernanda Henrique (PT) compartilha os desafios e conquistas de ser mulher na política, destacando a luta contra o machismo e racismo.

Representatividade e luta por igualdade um dos pilares de Fernanda Henrique. Foto: arquivo pessoal

Nascida em Ribeirão Pires, Fernanda Henrique, 38 anos, atriz, mãe de duas filhas e vereadora eleita com 1041 votos, destaca a importância do Dia Internacional da Mulher. Em entrevista, ela aborda os desafios de ser uma das poucas mulheres na Câmara Municipal, a luta contra o racismo e machismo, e sua visão sobre a participação feminina na política.

Como você se sente sendo uma das poucas mulheres na Câmara Municipal?
Ser uma mulher preta em um espaço de debate é sempre um desafio, uma
provocação, uma resistência e não será diferente até a sociedade conseguir entender que o
racismo é o pai das outras violências e precisa ser combatido com leis, formação,
penalidade exemplar e justa. Não posso deixar de falar sobre a invisibilidade da mulher
preta quando ocupa algum cargo de poder ou de decisão, ela normalmente é subestimada,
ignorada ou descredibilizada e isso tem consequências sérias para a mulher que estão
nesse processo de resistência quando alcançam esse patamar e desestimula outras
mulheres pretas a querem estar nesses espaços.
Ocupar uma das 17 cadeiras na Câmara Municipal é uma responsabilidade
gigantesca, mas estou pronta para esse desafio. Não venho de longe conheço a cidade e
suas necessidades, estou nas ruas e deixando sempre a porta do meu gabinete aberta para
receber as demandas dos moradores e é assim que vou trabalhar. Meu compromisso é com
a luta por uma cidade mais democrática e acessível a todos e ser eleita é receber 1041
votos de confiança me traz força, normalmente ouvimos que os vereadores abandonam o
povo depois das eleições e o que eu venho dizendo é que as pessoas que votaram em mim
não se esquecam de mim, sou representante do povo e preciso do povo para continuar
ocupando esse lugar.
Quais os maiores desafios que você enfrentou ao iniciar sua carreira política como
vereadora?

Eu já tenho uma trajetória política na cidade e na região antes de me tornar
vereadora e ser eleita foi uma conquista importante para dar continuidade a essa
caminhada. A experiência que tive sendo chefe de Gabinete do Renato Foresto me trouxe
segurança para lidar com algumas situações e base para desenvolver a minha própria
história nesse espaço de debate que é a Câmara Municipal. Tenho recebido apoio de
muitas frentes de luta e do meu partido, não chego sozinha, tenho uma rede que contribui
com o mandato trazendo discussões e pautas pertinente e ajudam muito quando preciso
então chegar aqui, é uma vitória conjunta mas que parte da minha militância e da
credibilidade que conquistei.
Dentro da minha atuação política e nos movimentos sociais eu conquistei outras
ferramentas para enfrentar os preconceitos e outros “desafios”, faço parte de dois grandes
movimentos aqui na região um que é o MDDF (Movimento de Defesa dos Direitos dos
Moradores em Núcleos Habitacionais de Santo André) e lá como artista educadora consigo
ver e ter na prática muitos elementos de resistência inclusive em instituições públicas, e o
outro movimento que me alimenta e me forma constantemente é a ARCA (Associação
Ribeirãopirense de Cidadãos Artistas) um espaço de práticas autônomas e criativas, uma
base que não me distancio.
Como você equilibra a vida pessoal (mãe, esposa) com a vida pública (vereadora)?
Tem sido um desafio mas tenho me dado conta. Minha família e minha rede de apoio
ajudam muito nesse processo, então organizei a rotina com as minhas filhas e a rotina do
gabinete para que as duas pudessem acontecer sem atravessamentos. É fácil? Não! Sou
dona de casa, mãe, atriz, amiga, presidenta do PT, mulher preta, filha, irmã e essas
jornadas me fortalecem para conseguir cumprir com os meus compromissos e ter sabedoria
para discernir e decidir as prioridades de cada momento. Ser vereadora é mais uma função
que entra na minha vida de forma bem fundamentada e agora conto com uma equipe no
gabinete que está preparada e com planejamento afinado para responder às demandas da
cidade, são competentes e temos uma sintonia muito produtiva e isso, ajuda muito para que
eu consiga ser coerente com meus princípios e manter minhas bases firmes. E tem um
ponto que é muito importante, minha família é muito amada e eu sinto que sou amada
também e isso é essencial para lidar com qualquer contratempo que apareça. Tenho me
empenhado para ser feliz nas funções em que ocupo e ver com alegrias as pequenas
conquistas.
Quais as principais dificuldades que você enfrenta como mulher na política?
A violência de gênero e raça é um fato que acontece em todos os espaços e na vida
política não é diferente. Tenho levado esse debate para o Partido dos Trabalhadores de
Ribeirão Pires e região, discuto situações que são micro violências que parecem
despretensiosas mas que precisam ser combatidas e expostas para que não haja repetição.
É preciso reforçar que ser uma vereadora do campo progressista e defender uma cidade
mais justa e democrática já é um grande desafio.
Você acredita que a presença feminina na política tem contribuído para mudanças
positivas na cidade?

Sim, claro! Ter diversidade de gênero e raça traz outros debates e outras soluções
para problemas que se não houvesse presença feminina não seriam analisadas e
executadas. Além disso é um direito das mulheres ocuparem espaços de poder, de debate
e proposituras até para garantir que políticas públicas possam ser criadas com mais
eficiência, mulheres atravessam todos os setores de uma sociedade, sabemos e vivemos a
cidade e temos propriedade para falar sobre saúde, educação, segurança e ter nossas
experiência asseguram maior efetividade, democracia e diversidade nas decisões políticas.
Tudo que acontece na cidade afeta as mulheres, então quem mais competente do
que nós para dizer o que precisa ser transformado na cidade, na política? Ocupar todas as
instâncias é desafio que está sendo conquistado a duras penas pelas mulheres, somos nós
que mais abdicamos das coisas para construir uma carreira profissional, nos julgam, nos
punem e criam obstáculos para dificultar nosso desenvolvimento mas preciso avisar que
não vamos parar, pelo contrário o avanço é inevitável e a revolução será feita por vozes
femininas. Essa realidade vai ser transformada quando as meninas, moças, e a juventude
começar a ter visibilidade desde sempre na escola, no trabalho e até dentro de casa,
precisamos incentivar as meninas a falar mais, discutir mais, se colocar mais, precisamos
tornar normal ver uma mulher com um microfone na mão dando palavras de ordem.
A realidade tem se mostrado feroz contra nossa luta, hoje no ABCDMRR temos
apenas 11 vereadoras eleitas de 150 cadeiras, é um absurdo! Não existem mulheres que
querem ser vereadoras?
Claro que existem e muitas são tão competentes e inteligentes
quanto qualquer vereador eleito, senão mais inteligente e competente. Esses dados dizem
muito sobre a falta de incentivo a candidaturas femininas ou empenho nas campanhas, os
partidos políticos precisam olhar para suas candidatas e respeitá-las com igualdade de
verba, equipe e apoio para as candidaturas municipais. E isso é possível? Sim e o melhor
exemplo é o PT de Ribeirão Pires na última eleição tivemos 9 candidaturas sendo 6 de
mulheres e 3 de homens, superamos a paridade, o PT de Ribeirão tem mostrado na prática
a capacidade de garantir maior participação das mulheres no universo da política,
considerando o fato que na eleição de 2024 a cota de 30% de género foi para os homens e
o resultado foi visto nas urnas, as 4 principais candidaturas foram de mulheres e todos com
mais de 400 votos, isso é muito significativo. E estamos construindo a cada dia uma nova
realidade para o campo progressista, esse é o jeito PT de lutar, Acredito que , vamos e
temos que mudar esses números na nossa região, é inadmissível que na casa do povo não
tenham representatividade igualitária de gênero e raça.
Como você lida com o machismo e o racismo na política? Já aconteceu algum caso
nesse inicio de mandato com os vereadores locais?

Eu lido como a maioria das mulheres pretas, enfrento com argumentos e atitudes
que expõe o racista e “educam” quem está por perto. Estamos trabalhando efetivamente na
Câmara Municipal desde 01 de janeiro de 2025 e não fui recepcionada da melhor forma
pela Casa cheguei para trabalhar e encontrei um gabinete sem estrutura mínima, paredes
manchadas, equipamentos surrados e sem justificativa plausível para essa recepção, não
pelo menos oficial mas não me abati, pelo contrário me engajei mais para transformar meu
gabinete no mais bonito da cidade, um lugar para ser feliz, um lugar de escuta e movimento.
Aprendi com a minha trajetória de luta que às vezes vai ser difícil e desistir será uma
possibilidade, mas sou atriz e trabalhadora da cultura e o teatro me trouxe o seguinte
aprendizado nos momentos de turbulência preciso descansar no cansaço e não desistir
combate. Até o momento não identifiquei nenhuma situação racista mas estou atenta e não
vou tolerar que aconteça comigo ou com qualquer outra pessoa nesse espaço que preza
pela democracia.
Como você pretende usar a sua voz para defender os direitos das mulheres na
cidade?

Ocupando a tribuna e tendo muita qualidade na escuta. Acredito que não é só com
gritos e manifestações que podemos trabalhar com essa pauta, mas se precisar gritar e me
manifestar para que outras mulheres pretas, mães e todas da cidade possam ser ouvidas
assim o farei. Meu mandato está a serviço da cidade e com a cidade vou trabalhar para
multiplicar os acessos e contribuir para que as políticas públicas já existentes sejam
executadas e propor novas que amparem, valorizem e deem segurança para as mulheres
de Ribeirão Pires. Não precisamos que ninguém nos empurre para andar, já evoluímos
sozinhas e sabemos qual é o caminho, o quê precisa ser feito é diminuir o impacto do
machismo e ampliar as vozes que já estão aí, gritando e se manifestando muitas vezes em
casa, nas igrejas, nas escolas, na feira, no ambiente de trabalho tóxico, são vozes abafadas
que precisamos criar meio para serem libertadas, para que elas se libertem. Quero ter a
escuta muito aberta para ser voz daquelas que historicamente foram silenciadas.
Que mensagem você gostaria de deixar para as mulheres neste Dia Internacional da
Mulher?

Estamos nas ruas e nas redes, estamos em todos os espaços e sem nós nenhum
deles existem, somos muitas e sabemos o que queremos e nossa jornada ainda está longe
de acabar, ainda temos várias batalhas e desistir não é uma opção por que somos nós por
nós mesmas, uma puxando a outra, uma defendendo e valorizando a outra. Mulheres
uni-vos