O Teatro na vida dos pequenos

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Recentemente o escritor Luís Fernando Veríssimo foi submetido a uma cirurgia no coração. Durante o período de internação recebeu diversas mensagens de leitores, amigos e admiradores desejando-lhe melhoras. Uma delas foi a carta de uma menininha de 10 anos, Olivia, que lhe fez uma encomenda muito especial: escrever uma história sobre pessoas que não gostam de acordar cedo, assim como ela. O colunista do jornal “O Globo” não teve como enviar diretamente a resposta à menininha (Olívia não deixou endereço!), então decidiu responder com um texto simples, divertido e muito delicado, na sua coluna semanal. Disse que escreveria, sim, a história, até porque ele fazia parte desse grupo de gente que não gosta de acordar cedo. Sugeriu, inclusive, criar uma Associação dos que Odeiam Sair da Cama de Manhã (AOSCM), com direito a reuniões e tudo, desde que não acontecessem muito cedo, claro. Mas lhe fez outro pedido.

“Você me fez um pedido e eu vou fazer um a você, Olivia. Por favor, continue sendo o que você é (…) uma pessoa que consegue emocionar outra pessoa com um simples ato de bondade, sem qualquer outro pretexto a não ser sua vontade de ser solidária. Você deve ter notado que o pessoal anda muito mal- humorado, Olivia. Se desentendem e brigam porque um não tolera a opinião do outro. Conversa vira bate-boca, debate vira, às vezes, até troca de tapas. Uma das crises em que o Brasil está metido é uma crise de civilidade. Não deixe que nada disso mude a sua maneira de ser, Olivia. O seu simples ato de bondade vale mais do que qualquer um desses discursos rancorosos. Animou meu coração mais do que um marca-passo. O Brasil precisa muito de você, Olivia.”

Mas o que essa história tem a ver com o teatro na vida dos pequenos? Ah, tudo mesmo. E não me refiro apenas à atitude da Olivia, que não sei se faz teatro. Também não me refiro apenas à atitude extremamente sensível do escritor de 79 anos que é também roteirista, autor de teatro, cartunista e músico. Me refiro à essência e sensibilidade humana.

“Olivia, eu também detesto acordar cedo. Vamos escrever sobre isso e transformar em arte.” E não “Que horror, Olivia, olha o que você está dizendo. Acordar cedo para estudar é importante para sua formação, para o seu futuro.”

Não estou dizendo que crianças devem fazer apenas aquilo que querem, que não precisam de limites, longe disso. Mas é fato que estão sendo cobradas e pressionadas como se fossem mini-adultos.  Claro que essa cobrança não é por mal. O que acontece é uma distorção de valores, do que é realmente primordial na infância, e que pode estar contribuindo para formação de adultos infelizes, insensíveis e intolerantes.

É lastimável uma criança brincar pouco. É lastimável que um joelho ralado seja menos importante do que o conteúdo da apostila. É lastimável que ser um adulto bem sucedido seja mais importante do que ser uma criança feliz. O fato é, criança que não brinca, não se desenvolve! Já nos dizia Vygostsky teórico da educação “As maiores aquisições de uma criança são conseguidas no brincar, aquisições que no futuro tornar-se- ão seu nível básico de ação real e moralidade”.

Uma brincadeira chamada Teatro

Cada ser traz consigo características e habilidades que o torna único. Alguns chamam de personalidade, outros de essência. Essas habilidades, geralmente, se manifestam na infância – brincando!

Durante as brincadeiras, na arte do “faz de conta” elas criam sem saber roteiros, cenários, estabelecem noções de tempo, espaço e lugar, inventam personagens e estabelecem relações muito interessantes e reais. Quando combinam com os amiguinhos um jogo em comum, se um deles discordar, o grupo terá que aprender a contornar a situação, entrar num acordo se quiser prosseguir com a brincadeira. Ou seja, os pequenos aprendem naturalmente a lidar com conflitos, com as diferenças e a dialogar para chegarem juntos num consenso. Esses são apenas alguns dos aspectos do teatro na infância.

O teatro nada mais é do que um brincar com regras, guiado por um profissional que instiga e ajuda a desenvolver ainda mais as habilidades dos pequerruchos. Um profissional que a partir das necessidades de cada criança, a auxiliará através da linguagem lúdica, não da repressão.

Eu poderia ficar horas falando dos benefícios que essa arte proporciona, desde o desenvolvimento do raciocínio, da coordenação motora e do repertório e consciência corporal até o aprimoramento da linguagem e despertar do interesse pelo aprendizado, pela pesquisa.

Mas, hoje eu quero lançar a pulguinha do “Não deixe de ser quem você é!”. Chamar a atenção para a valorização da essência das nossas crianças, essência essa que não deve ser perdida e o Teatro sempre será uma bela opção, não apenas para a formação de atores, mas para a formação de adultos mais saudáveis, felizes e conscientes.

Afinal, o Brasil precisa muito da Olivia e também do Pedro, da Rafaela, da Sophia, do João, do Cadu…